Mortalidade invejada.

Os deuses nos invejam, tomados por inveja de nossa mortalidade, pois a qualquer instante pode ser o nosso último. Sendo meros mortais mesquinhos, condenados a um tempo finito que escorre entre os dedos como areia, tendo como a única certeza de vida senão a morte.

Assim como nunca seremos mais bonitos do que somos agora, jamais estaremos aqui novamente. Cada instante é uma partícula que nunca poderá ser recuperada. É nesse vislumbre fugaz da existência que reside a nossa beleza única e irrepetível, que tanto invejam os deuses.

Olhe ao redor. As flores que desabrocham e murcham a cada estação do ano, as folhas que dançam ao vento antes de caírem, os rios que correm incansáveis em direção ao oceano. Tudo é findável, transitório. A própria existência é uma sinfonia que toca seus acordes por um breve instante e depois se dissipa no silêncio eterno.

Nós, mortais, carregamos a consciência da transitoriedade. É essa consciência que nos permite saborear cada segundo, cada toque, cada riso, como se fossem os últimos. O tempo é um luxo que não nos pertence, e é justamente por isso que os deuses pagariam com suas próprias almas por esse almejado tempo finito.

Eles observam, enciumados, enquanto abraçamos o pôr do sol em nossos olhos famintos, e suspiram em puro ódio quando nos entregamos ao abraço ardente de um amor apaixonado. Pois enquanto eles existem na eternidade, nós existimos na intensidade do presente. Somos seres de carne e osso, vulneráveis e frágeis, mas dotados de uma capacidade única de sentir e experienciar cada fragmento de vida.

Os deuses, imortais e imutáveis, nunca poderão conhecer a doçura do beijo roubado, a adrenalina que percorre nossas veias diante do desconhecido, o sabor amargo da despedida. Por isso meus amigos mortais, digo a vocês, abracemos a mortalidade.

Comentários

Postagens mais visitadas